Ah, quanta saudade eu senti esta semana de minhas tias Angelina e Norma! Embora não fossem gêmeas, essas duas belas cancerianas aniversariavam no dia 07/07. E seus aniversários eram comemorados sempre na minha casa, onde a tia Angelina morava.
Tia Angelina
A tia Angelina era também a minha madrinha de crisma e foi a pessoa com quem convivi mais tempo sob o mesmo tempo.
Ela sempre morou com a minha mãe e a ajudou a criar seus 4 filhos. E quando a minha mãe faleceu, eu assumi a responsabilidade de cuidar dela, embora ela preferisse crer que era ela quem cuidava de mim. A verdade é que nós cuidávamos uma da outra, cada qual fazendo a sua parte. Nossa convivência foi pautada por muitas discussões, mas também por muito companheirismo e muita cumplicidade.
Ao contrário da minha tia Norma, e da minha mãe, a tia Angelina não era lá muito bem humorada e tinha certo tom autoritário em seu perfil, tanto é que um de seus cunhados, o tio Constantino, este sim um exemplo de bom humor incrível, costumava dizer que na minha casa predominava o parlamentarismo: minha mãe era a presidente, mas minha tia era a 1ª ministra e, como tal, queria exercer o poder de fato.
As duas disputavam nossa atenção, isso era indiscutível, mas também hilário. Assim sendo, quando uma delas começava a contar alguma história do passado a outra vinha para corrigir e no fim elas discutiam e a gente ficava sem saber o final da história. Era quase sempre assim!
Talvez por ter ficado solteira, ou por temperamento mesmo, minha tia Angelina era moralista e se a gente deixasse, ela impediria que saíssemos sozinhas com nossos namorados. Aliás, ela ficava horrorizada com as mulheres que apareciam de biquíni na televisão, sobretudo com as que desfilavam "quase nuas no carnaval". Era tudo “uma vergonha!!!" como ela costumava dizer.
Muito nervosa quando mais moça, ela foi adocicando seu jeito de ser com o passar do tempo, mas jamais perdeu o tom questionador e até mesmo beligerante em algumas situações. Decididamente ela era uma mulher de personalidade forte, mas também muito leal: ela não admitia que falássemos mal um do outro ou de algum parente. "Família é para ser respeitada e preservada", dizia esta canceriana.
Mas ela era também uma mulher muito prestimosa, sabia bordar e costurar muito bem e fez vestidos belíssimos para mim e para a minha irmã até entrarmos na adolescência. Extremamente organizada, ela mantinha a casa impecável, mas não era muito chegada a cozinhar, não. Essa era tarefa de minha mãe, exímia cozinheira.
Estou me lembrando, agora, de que toda a vez que minha mãe adoecia, nós 4 sabíamos o que nos esperava: comer bife de panela todo o santo dia até a minha mãe recuperar-se. Quando a minha mãe faleceu, ela teve que aprender a se virar na cozinha, mas por garantia eu também comecei a me aventurar nas artes da culinária. Foi só então que eu descobri que eu amo cozinhar! Mas para ser justa, a tia Angelina saiu-se muito bem também.
Há duas outras passagens que quero compartilhar com você:
A primeira foi quando a tia Angelina caiu da escada e fraturou a clavícula em 4 lugares e também o crânio. Logo depois que ela caiu, ela foi tirar pó dos móveis e limpar o banheiro como se nada fosse. Eu insisti em chamar o médico, mas ela não quis saber. Ocorre que no dia seguinte o quadro piorou e não teve jeito: ela teve que ser hospitalizada, pois o médico imediatamente desconfiou de um traumatismo craniano. Os exames comprovaram que ele estava certo.
Conhecendo-a muito bem, eu lhe pedi que não contasse a ela sobre a fratura no crânio; eu temia que o impacto dessa notícia pudesse agravar o quadro pelo fato de ela ser cardíaca; afinal, quando estava sendo hospitalizada, ela olhou assustada para mim e disse: “Rosa, gente velha quando cai morre!” E a saída que o Dr. Osmar, cunhado do meu irmão Fernando, encontrou foi engessar a perna dela, que não sofrera nenhum abalo, para mantê-la quieta na cama. Eu lembro que ela dizia para mim: “Que coisa estranha, eu não sinto nada na perna, mas eu fico um pouco tonta quando eu levanto a cabeça. Por que será?”. E eu lhe respondia: “É de ficar muito tempo na cama, tia, logo, logo passa”. Depois eu contei a ela o que de fato ocorrera e rimos muito desse episódio; mas ela confessou que se tivesse sabido da fratura na cabeça poderia "ter morrido de medo", literalmente.
A outra passagem refere-se a uma das muitas broncas que ela dava em mim porque eu gostava de curtir a noite, dançando, bebendo e me divertindo com amigas (os) e namorado. Ela não se conformava com isso, sobretudo quando eu ficava de ressaca e tinha que trabalhar no dia seguinte.
Aqui tenho que fazer um parêntese: A tia Angelina tinha o hábito de ir ao meu quarto todas as manhãs, para me acordar, embora soubesse que eu jamais tivera problemas para despertar no horário, mas ela gostava de fazer isso, então eu deixava.
Em uma dessas ocasiões, quando ela foi me chamar eu reclamei de não estar me sentindo bem, devido à ressaca. E ela, reagindo muito, mas muito indignada mesmo, disse-me : “Não tinha juízo aos 15, não teve aos 20, não tem aos 30: Sempre bêbada!!! Hahaha.
Quando eu cheguei à Lintas, agência em que trabalhava, e contei este episódio aos meus amigos, Inah Antunes Alves e Walter Pereira, eles riram muito e disseram que esta frase mereceria ser afixada em minha lápide.
Minha tia Angelina faleceu, em 12/04/1987, com mais de 80 anos e deixou uma saudade imensa, mas também muitas histórias, que me dão prazer em relembrar e em contar; afinal, cada vez que o faço eu trago a tia Angelina mais perto de mim e permito que ela participe do meu presente, de algum modo.
Encerro com o link para uma das músicas que ela mais amava: “Asa Branca” com Luiz Gonzaga e outras feras.
Tia Norma
Minha tia Norma era a caçula de 9 filhas que a minha avó, Elizabetta Guaraldo, teve com o meu avô, Ferdinando Benetazzo, mas duas delas não sobreviveram. Todas elas nasceram em Piracicaba, interior de São Paulo - a foto que ilustra esta postagem é do Salto de Piracicaba.
A tia Norma tinha um problema na coluna que a tornara “corcunda” e em função disso, tinha baixa estatura. Seja por causa da doença ou pelo fato de ela ser a caçula, a verdade é que ela era a queridinha da família - não só das irmãs e cunhados, mas de todos os sobrinhos.
Com um jeito moleque, um senso de humor admirável, ela era a alegria das festas promovidas por nossa grande família.
Quando minha mãe se casou levou para morar com ela a minha avó e essas minhas duas tias, sendo que a tia Norma casou-se logo depois. Sei que ela morou em várias cidades, mas a casa da qual eu me lembro ficava em Presidente Altino. Minha tia morava numa espécie de vila construída para os funcionários do frigorífico Wilson onde o seu marido, o tio Wandick, trabalhava como veterinário. A gente ia para lá de trem e era uma delícia.
Ela não podia ter filhos, de modo que quase todos nós, seus sobrinhos mais novos, disputávamos a sua atenção e ansiávamos passar alguns dias em sua casa, cujo quintal dava para uma imensa área verde onde colhíamos amoras e outras frutas, bem como palmitos, legumes e verduras. Havia também o rio Tietê livre de poluição e navegável, onde era possível pescar.
Todos os fins de semana minha tia e o meu tio se hospedavam em minha casa. E nós aguardávamos felizes a sua visita porque ela iluminava o ambiente em que entrava.
Quando eu tinha 12 anos a minha tia Norma faleceu e foi muito sofrido para todos nós. Na verdade o sofrimento começou quando ela teve sarcoma. A notícia caiu como uma bomba na família. Ela e o meu tio mudaram-se para a minha casa para que ela pudesse ficar perto de suas irmãs e de seus sobrinhos. A doença era fatal, mas até o último instante todos nós esperávamos por um milagre.
Eu me lembro bem da última festa da qual ela participou: foi uma grande festa junina feita na minha casa com a colaboração de toda a família, o que totalizava cerca de 40 pessoas, bem como de alguns amigos e vizinhos queridos. Mesmo com o braço na tipóia – a doença começou pelo braço –, minha tia Norma, dançou não só a quadrilha, mas todos os ritmos que foram tocados na festa, inclusive o swing - um ritmo derivado de jazz que fez muito sucesso nas décadas de 40 e 50, ao som de orquestras lideradas por bandleaders como Glenn Miller, Harry James, Tomy Dorsey, Duke Wellington, Benny Goodman, Count Basie, etc.
Também me lembro da tristeza que ela tentava disfarçar quando cantava “Que será, será”, música do filme “O homem que sabia demais”. Ela intuia que a hora dela estava chegando, mas caso nós a surpreendêssemos chorando ela pedia para ocultarmos o fato de seu marido, para não preocupá-lo ainda mais.
Antes de morrer ela deixou determinado que presentes de Natal meu tio deveria comprar para cada um de nós. E ela se foi no dia 18/11/1957.
Embora ela tivesse falecido na minha casa eu não assisti ao seu velório, nem ao seu enterro. Isto porque no dia em que ela morreu quando fui tomar-lhe a benção antes de ir para a escola – hábito que tínhamos, minha irmã e eu -, senti a sua mão fria e imediatamente veio à minha mente a imagem do meu pai no caixão – fato que ocorrera quando eu tinha 4 anos. Fui para a escola chorando e naquele dia praticamente não houve aula na minha sala, pois as irmãs do colégio em que eu estudava, o Santana, pediram preces, abordaram o tema da morte e procuraram me consolar, pois eu não conseguia parar de chorar; eu "sabia" que naquele dia a minha tia morreria.
Quando voltei para casa, à tarde, minha mãe disse que era melhor eu ir para a casa de uns amigos, de modo que nem cheguei ver a minha tia; eles me contaram que ela já havia recebido a extrema-unção. De lá eu e minha irmã fomos para casa da minha tia Eugênia e foi então que eu tomei conhecimento do falecimento da tia Norma. O choque desencadeou em mim uma crise de ausência, mal que fora diagnosticado uns dois anos antes, por isso só voltei ao meu lar dois dias depois do falecimento dela.
Foi muito difícil voltar para casa sabendo que eu não iria mais encontrar aquela figura pequena, tão querida e tão corajosa, que me recebia sempre com um belo sorriso, querendo saber como tinha sido o meu dia na escola.
Foi muito difícil voltar para casa sabendo que eu não iria mais encontrar aquela figura pequena, tão querida e tão corajosa, que me recebia sempre com um belo sorriso, querendo saber como tinha sido o meu dia na escola.
Encerro este relato deixando o link para o trecho do filme, "O Homem que sabia demais", em que Dóris Day canta “Que Será, Será”.
Haahahahahahahahahah!
ResponderExcluirEssa de engessar a perna para disfarçar traumatismo craniano deveria entrar para prática comum na medicina!!!
essas histórias da sua família,saõ the best moçinha.emociona e faz rir
ResponderExcluirbeijos rosas,Mu
Oi Tia querida , adorei esses textos.. especialmente sobre a Ria Angelina que era um personagem especial cheio de amor né..é uma das pessoas importantes da minha historia.. realmente me deu uma enorme saudades dela!!!
ResponderExcluirBjks a ela onde esteja!!!! Aproveito hoje para dar parabens a Nona tão querida , onde ela esteja...com certeza as duas estão lá em cima
olhando por todos nós e quebrando autos paus!!!!
Dani Pacini